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25 Abril: A inesquecível viagem do Sporting à RDA e o regresso em festa

Passaram-se 40 anos, mas Carlos Pereira e Tomé ainda guardam bem vincada a meia-final da Taça das Taças de futebol que o Sporting jogou a 24 de abril de 1974, na véspera do dia que mudou Portugal.

25 Abril: A inesquecível viagem do Sporting à RDA e o regresso em festa

Não só pela eliminação ante uma equipa da Alemanha Oriental, o Magdeburgo, que parecia acessível, mas sobretudo pela insólita viagem de regresso, cheia de peripécias. E a equipa só chegou a Lisboa no dia 26, quando o poder já tinha mudado e a ditadura era passado.

À pergunta clássica do repertório de Herman José, "onde é que estavas no 25 de abril?", jogadores e equipa técnica responderiam que estavam perto da fronteira encerrada, em Badajoz, aguardando que a passagem fosse finalmente autorizada, após horas e horas de espera ansiosa, sem saber muito bem o que se ia passando em Lisboa.

Hoje, quando relembra, no museu e no novo estádio do Sporting, esses dias de abril de 1974, Carlos Pereira ainda recorda o autogolo que marcou no estádio José Alvalade (1-1), em jogo de azares sucessivos, que poderia ter terminado com a goleada aos alemães. E Tomé não se “perdoa” o golo que falhou em Magdeburgo, que poderia ter rendido a eliminatória (2-1).

Carlos Pereira foi titular na defesa que jogou em Magdeburgo e Tomé entrou nos últimos 10 minutos, na tentativa de virar uma eliminação penosamente sentida por todos, extenuados pelo que se esforçaram no jogo, depois de uma deslocação nada fácil para a RDA.

“As viagens já eram um bocado cansativas, havia uma série de pormenores, como passar de uma Alemanha para a outra, com muitas revistas. Agora, há voos fretados, mas naquela altura havia muitas paragens para chegar a um destino desses, era uma viagem sempre mais demorada”, lembrou Carlos Pereira, adjunto de Paulo Bento anos mais tarde.

O pior foi o regresso para a RFA, já de madrugada, quase de manhã, com a angústia de rumores vindos de Portugal, a juntar-se ao "peso" da derrota.

“Em Frankfurt, estavam uns moços da TAP e eles é que nos confirmaram a notícia. O tradutor, no muro de Berlim, já nos tinha dito que estava a haver um problema em Portugal, com um golpe de Estado. Nós, sinceramente, nem ligámos nada, passámos ao lado daquilo, estávamos tão focados na derrota”, prosseguiu Carlos Pereira.

"Nós tivemos primeiro conhecimento [do golpe] através do intérprete, que aprendeu português através de discos de fados", recordou Tomé. Mas, a notificação oficial à equipa foi feita pelo presidente do Sporting, ainda na estrada na RDA.

A lembrança está presente. “Recordo-me de que João Rocha, que ia num carro com os diretores do Magdeburgo, encostou à direita e mandou-nos encostar atrás. Entrou no nosso autocarro e falou ‘é só para dizer à rapaziada que há um golpe de Estado em Portugal’. Ficámos com a certeza absoluta de que tinha havido qualquer coisa fora do normal...”

Algo se terá perdido nas traduções e o que iam "sabendo" de Lisboa dava conta de um "mar de sangue", que preocupava. "As notícias eram assustadoras", recordou Carlos Pereira. Tomé acrescenta o que lhes asseveravam ter ouvido na BBC - "milhares de mortos e centenas de milhares de feridos... ainda nos rimos um pouco, com um dos acompanhantes que disse 'é pá, e eu que deixei o meu carro na Baixa'".

"Já estávamos todos 'rotos', e as mentes não eram as mais perfeitas e as mais sãs, na altura", disse Tomé. "Em Frankfurt, ficámos extremamente alarmados, falava-se em mortos, em canhões, fronteiras fechadas, meios de comunicação fechados. A situação da derrota já estava posta de lado".

O fim da "odisseia do Sporting" ainda não estava à vista, já que à proibição de viajar de Frankfurt para Lisboa, com desvio para Madrid, se juntou depois uma viagem de autocarro "travada" na fronteira do Caia, entre Elvas e Badajoz.

"Chegámos à fronteira e não nos deixaram passar, tivemos que vir para um ‘hostal’ em Badajoz. Não cabiam todos e alguns tiveram de ficar nas escadas. Eram oito de manhã (do dia 26) e fomos acordados, que as fronteiras já estavam abertas, mas era mentira", contou Tomé.

"Estava um batalhão de carros para passar, da imprensa estrangeira, uma tremenda fila e não deixavam passar ninguém. O que valeu foi que o João Rocha conseguiu falar com o Spínola, por telefone, e finalmente fomos autorizados a passar", recordou Carlos Pereira. Já o dia 26 ia a meio e tudo estava a começar a alterar-se em Portugal.

O autocarro do Sporting, cheio de "estrelas" do futebol da época, campeões nacionais nesse ano, chegou a Lisboa ao final do dia e aí confirmou-se que não havia, de facto, violência nas ruas e que 24 horas depois da operação militar que levou ao fim do regime tudo estava calmo.

Tomé foi dos primeiros a saírem do autocarro, já que ficava em Setúbal, e relembra o primeiro relato de um amigo: "... não, isto anda é tudo satisfeito, os soldados têm cravos nas espingardas... Houve uns tiros lá para Lisboa, junto à PIDE, mas só isso."

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