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Brasil: O ‘joga bonito’ precisa de ganhar corpo

Desde há muito tempo que o futebol brasileiro assenta nos craques que vão surgindo com regularidade. O jogador anárquico, fantasista, está no centro do futebol do Brasil. Só depois surge o coletivo (quando surge). Como muito bem relembrou Carlos Daniel (A vitória dos teóricos, rtp.pt, 9 de julho ), os dois últimos triunfos do escrete em Campeonatos do Mundo – 1994 e 2002 – resultaram do génio de atletas como Romário e Bebeto, nos EUA, e de Ronaldo, Rivaldo e Ronaldinho, na Coreia/Japão.

Brasil: O ‘joga bonito’ precisa de ganhar corpo

Contudo, também surgiram algumas derrotas pela excessiva concentração nos indivíduos. Como a da geração dourada (Zico, Falcão, Sócrates …) que não conseguiu ganhar o Espanha-82, apesar de ter encantado o mundo do futebol, por exemplo.

O jogador é, assim, o principal traço da identidade do futebol brasileiro. É uma característica absolutamente hegemónica. Durante muito tempo chegou para levar o Brasil ao topo. E isso redundou numa certa acomodação e, porque não dizê-lo, arrogância. A lógica que imperava era a de que quem tinha os melhores atletas ganhava. E o Brasil sempre teve grandes futebolistas em quantidades superiores às das outras formações. Contudo, tal como a Inglaterra percebeu dolorosamente que já não tinha o melhor futebol quando participou pela primeira vez num Mundial, em 1950, depois de se ter excluído dos anteriores, a atual seleção brasileira vê-se forçada a encarar uma dura realidade.

A estrondosa derrota com a Alemanha serviu para questionar tudo. A título de exemplo, o próprio Zico escreveu (Em busca do estilo brasileiro perdido, O Globo, 10 de julho) que «é hora de calçar as sandálias da humildade e começar do zero». Carlos Alberto Parreira, coordenador técnico da seleção goleada, fez questão de alertar, em conferência de imprensa, para a enorme diferença de condições de treino e formação que atualmente separa a Alemanha do Brasil. Ora, não faltam vozes a propor mudanças.

Depois de uma grande derrota é normal sublimar tudo aquilo que o adversário que nos venceu faz. Por estes dias não faltam elogios à Alemanha, sendo que a maioria deles são inteiramente merecidos. A glorificação da organização coletiva, do trabalho em continuidade e da formação são absolutamente louváveis, apesar de surgirem a par de outras exaltações ilusórias, à boa maneira positivista (basta relembrar o frenesim determinístico que rodeou as notícias relativas ao suporte tecnológico da 'mannschaft'). A tentação para imitar é muita. E muito pouco recomendável.

Tal como as marcas precisam de se diferenciar, criando uma identidade própria, para ganhar um espaço duradouro, o futebol de um país precisa de se estruturar em função do seu contexto único. O Brasil não é a Alemanha. Um brasileiro tem um capital cultural e social distinto de um alemão. Como é óbvio, é possível aprender com as experiências dos outros. Mas a sua transposição deve ser sempre enquadrada.

Assim sendo, o que é que deve acontecer à corrente identidade do futebol brasileiro? O que é que deve acontecer ao ‘joga bonito’ centrado nos jogadores? A resposta mais óbvia, por causa do resultado recente, seria dizer que tem de dar lugar ao modelo alemão coletivista. Contudo, partindo da comunicação, diria que o que tem de acontecer é algo bem menos revolucionário.

O ‘joga bonito’ tem de ganhar um corpo. Esse corpo não é físico, esse corpo é o jogar coletivo e dinâmico próprio de uma modalidade que se pratica em equipa. E os craques têm de viver dentro desse corpo, não podendo ser o seu fim. São apenas mais um dos seus membros e, porventura, aquele que o torna único. Assim sendo, a identidade construída tem de evoluir, tem de se complexificar, ganhando novos traços. Mas não se deve diluir em favor de fórmulas alheias.

Este texto é resultado da colaboração semanal entre o Futebol 365 e o blogue marcasdofutebol.wordpress.com. Esta parceria procura analisar o desporto-rei a partir de um ângulo diferente: a comunicação.

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