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FC Porto: A entrevista suicida de Pinto da Costa

Artigo de opinião de Gil Nunes.

FC Porto: A entrevista suicida de Pinto da Costa
FC Porto

Desta vez as empresas de sondagem nem eram necessárias. Nem tão pouco os bruxos. Percebia-se, claramente, que André Villas-Boas levava vantagem no confronto com Pinto da Costa e que o mais natural seria o FC Porto assinar a sua transição diretiva no dia 27 de abril de 2024. Tal como aconteceu. Não se esperava, contudo, que a diferença fosse tão dilatada. Goleada. Por aí residiu a surpresa.

E a surpresa veio em tons de palavras. Pinto da Costa difuso. Como se existisse um “Dr Jekyll e Mr Hyde” dentro de si. Por um lado, um “Alta Definição” com Daniel Oliveira em que, até de forma terna e muito lúcida, falou de si mesmo com a genuinidade que o caracteriza, mostrando aqueles deliciosos requintes de fina ironia que o tornaram e tornam numa personalidade verdadeiramente única da sociedade portuguesa, e o grande defensor da região norte das últimas décadas. Pinto da Costa como um homem culto e com evidentes preocupações sociais, que positivamente extravasam o próprio alcance de um dirigente desportivo que, no seu caso, nunca foi uma ilha. Falar de Pinto da Costa é falar do Porto. Do melhor/ mais altruísta/ mais encantador que o Porto e a região possuem.

O problema foi o outro lado. No início de abril, numa entrevista SIC conduzida pelo jornalista António Reis, Pinto da Costa foi o contrário de si próprio. Mal aconselhado ou então surpreendentemente impreparado, aquele Dia das Mentiras foi, na realidade, uma verdadeira antítese da sua imagem. Desde o real ou gambuzino tipo que pediu para filmarem “tudo” na Assembleia Geral ao facto de as arbitragens terem, na sua opinião, mudado desde que André Villas-Boas apresentou a sua candidatura, houve ainda tempo para um desvio para a família Pedroto e, sobretudo, para algo de mais grave quando estamos em campanha eleitoral: o “não digo” ou então “perguntem a quem vai estar responsável por isso”. Ele que explique.

Mas então como vai aumentar a receita e diminuir a despesa? Não sei, mas eles (a minha equipa) têm um plano muito bom. Mas alguém imagina Pedro Nuno Santos ou Luís Montenegro, em entrevista e em dinâmica de campanha, a darem resposta semelhante? Suicida. Isto porque, no final de tudo, as mensagens valem ouro nestas contas eleitorais e há uma verdade que sempre pontifica: mais vale resposta capsulada em erro - e que pode ser corrigida a montante - do que virarmo-nos para o contexto do possível ato eleitoral e dizer que não sabemos. Errar é humano, não saber e deixar nas mãos dos outros é insensato. Laxista. E perigoso. E ninguém vira a duzentos à hora para a estrada do perigo.

E a questão impõe-se: será que o avatar que apareceu na entrevista de António Reis é o mesmo homem que foi entrevistado por Daniel Oliveira? O mesmo que adora poesia e recita “O Menino da Sua Mãe” de Fernando Pessoa de cor e salteado? Ou será que existiu alguma situação inexplicável? Porque, pegando em Fernando Pessoa, “também Jesus Cristo não sabia nada de finanças e nem consta que tivesse biblioteca”. Mas o Presidente do FC Porto deve saber. Deve estar a par. Porque as finanças, mais do que o coração da fina gestão, representaram também o aspeto decisivo desta campanha eleitoral. O fator que realmente pesou e fez a diferença na hora de verdade. Na hora do voto.

Pois os adeptos querem títulos, mas não querem ver o FC Porto enrodilhado nas teias do fair-play financeiro da UEFA. Querem que as vendas avultadas sejam traduzidas em novos investimentos que assegurem a competitividade da equipa. É lógico que já se sabe que o mercado português tem limitações e que não se pode substituir peça vendida por igual peça comprada. Tal é impossível. Agora, dava imenso jeito ter um plantel retocado com jogadores de qualidade indiscutível, sendo que tal pressupõe algo de evidente: boa gestão, contas equilibradas. O coração de tudo. E não ter de reconstruir temporada após temporada como se fosse uma obrigação trazida pelos ventos do destino.

Os portistas optaram, sobretudo, pelo candidato que forneceu respostas que, bem ou mal, podem ser avaliadas nos próximos anos. Bem ou mal é por aí. Seja na revisão completa das obrigações de dívida e do passivo, seja na avaliação detalhada do dossiê da futura academia ou, então, na clarificação de que o problema não está no treinador, o grande trunfo de Villas-Boas residiu na mensagem clara e no aproveitamento do discurso de um oponente que até lhe fez um tremendo favor quando o tratou por “Luís André”. Que foi repetido vezes sem conta na tal entrevista suicida. Se não tenho receio do meu adversário, então poucas vezes falo dele. E quase nem me lembro do seu, nem por sombras o seu nome completo.

É verdade que o “Presidente dos Presidentes” e a personalidade mais importante da história do clube não merecia o que lhe aconteceu. Sair como derrotado. No entanto, não deixa de ser curioso que até os contornos da derrota são altamente benéficos para os dragões: é certo que em democracia todos contam, mas a marca de 80% garante a resposta imediata para um dos problemas de superfície. A união. A votação expressiva revela uma maioria esmagadora, traduzida também num reconhecimento unânime em relação a 42 anos de liderança que catapultaram o FC Porto para uma plena e justa dimensão nacional e internacional. Que teve um rosto: Jorge Nuno Pinto da Costa. O que foi entrevistado por Daniel Oliveira no “Alta Definição”.

E também dá jeito ter um Presidente que foi treinador. E que vê, com os seus próprios olhos, que a equipa (sobretudo do meio-campo para a frente) tem um potencial de crescimento brutal e, ao contrário do que os resultados internos pintam, não necessita de revoluções, mas sim de afinações. Se for com Sérgio Conceição, que montou a máquina, tanto melhor. Ao técnico, o facto de se ter mantido “fiel ao rei” até ao limite só lhe assenta bem. Bem mais cómoda teria sido uma postura salomónica. Lavo daqui as minhas mãos e depois logo vejo. E Villas-Boas também percebeu isso. A paz promete voltar ao Dragão.

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