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Braga: Vida e obra de Zalazar em três minutos

Artigo de opinião de Gil Nunes.

Braga: Vida e obra de Zalazar em três minutos
Futebol 365

Para esculpir na Pedreira e não mais esquecer: contra equipas de bom nível, não se podem cometer erros individuais grosseiros. Ou então esculpir na cabeça dos intervenientes. Seja de quem for. Porque a partir daí entramos na residência do senhor óbvio: os ajustes nunca são melhores do que o plano individual definido. Ou então estar 87 minutos a correr atrás do prejuízo é sempre diferente do que ter o marcador a zero, sendo que o adversário também tem de correr riscos se quiser adquirir a vantagem.

Foi esse o busílis da questão: o erro individual de Zalazar proporcionou o golo a Tengstedt e, mais importante do que tudo isso, quebrou a cadeia e o “jogo do gato e do rato” que pressupõe um combate dos chefes. Um jogo entre os grandes. Depois, também no domínio do pensamento uma questão tática: por muito que Artur Jorge argumente que a troca de Zalazar por André Horta também se deveu (e tem razão) ao ajuste das linhas de pressão/impedir que o Benfica conquistasse a profundidade a partir da construção baixa, certo é que a componente psicológica também passa fatura: percebeu-se que Zalazar perdeu a tranquilidade necessária para continuar em jogo, sobretudo quando o seu papel era fundamental: ligar rapidamente os setores (passada larga conjugada com excelente domínio em progressão e exploração das zonas de finalização), encostando o Benfica mais às cordas e, por benefício indireto, soltando os alas para situações de duelo individual nos corredores. Contexto que o Benfica não aprecia.

Sim, porque o esqueleto da estratégia também por aí passou: pressionar os laterais adaptados encarnados, obrigando-os ao erro e a situações fora do seu ADN natural. E Morato levou um amarelo logo a abrir, bem abafado pela tal precoce conquista da vantagem. Seja como for, e do lado do Benfica, há alguns pontos positivos a ressalvar: a construção a partir da retaguarda, bem assente em Trubin e no recuo ponderado de João Neves para a zona central, situação que permitiu libertar os centrais para novas linhas de passe (junto aos corredores) e, com isso, espraiar a pressão do Braga, adquirindo-se zonas livres para se explorar a profundidade. E profundidade construída em laboratório, com alvos definidos no computador: colocar gente rápida em torno de José Fonte, para bruscamente se acelerar e chegar ao golo.

A entrada de André Horta permitiu ao Braga readquirir o equilíbrio no miolo e, por conseguinte, reajustar a máquina em torno de uma dinâmica ofensiva condizente com elementos de elevada craveira técnica. Com João Moutinho a garantir a subida das linhas, o Benfica teve necessariamente de recuar e prescindir de uma posse de bola mais efetiva, e não o fez por uma questão de subserviência. É certo que o Braga tem do meio-campo para a frente os seus maiores atributos, mas tal cenário esbarra com um dos principais eixos do Benfica: a exploração da profundidade. A capacitação de três elementos com pouca predisposição defensiva – Di Maria, Rafa e Tengstedt – mas com muita habilidade na altura de atacarem o espaço e potenciarem condições favoráveis a toda à equipa às custas desse mesmo ramalhete.

Do lado dos arsenalistas, houve outra alteração que teve uma consubstanciação na prática: a troca de Serdar (potencial) por Niakaté (consolidação). Por um lado, o amarelo ao jogador turco, por outro lado também o reforço da capacidade de construção a partir da zona central, mas há, sobretudo. a mãe de todas as razões: a recuperação plena do central mais capaz, numa lógica de que uma equipa como o Braga não pode chegar a dezembro com 33 golos sofridos. Não pode. E, não fosse a tremenda qualidade do meio-campo e da linha avançada, com este desígnio o Braga andaria por esta altura fora da Europa e a patinar no meio da tabela. Mas tal contexto é mérito de um treinador arrojado e corajoso: não é qualquer um que constrói uma máquina com tanta minúcia, versatilidade, e potenciação dos seus intérpretes no plano ofensivo.

Se Trubin fez a diferença? Sim, fez. Com duas intervenções de elevado grau de dificuldade, colocou o coração do Benfica dentro do jogo. Mas a questão é que Oydsseas também as fazia. E muitas vezes. Ou seja, não é por aí. Mas é por outro lado: com uma propensão muito maior para o jogo de pés e controlo de profundidade, o Benfica torna-se mais tranquilo no que ao processo de construção diz respeito, com a afinação deste procedimento a gerar um positivo contágio em zonas mais avançadas do terreno. Às vezes, os grandes guarda-redes são aqueles que evitam o perigo antes dele acontecer, e não aqueles que acionam o mecanismo de emergência vezes sem conta.

Com esta vitória, o Benfica sublinha algo de diferente em relação à época passada: uma maior capacidade de resposta perante os rivais diretos da liga. Na realidade, os encarnados venceram Sporting, FC Porto e Braga e nada se faz sem mérito. Mas há o outro lado da nova fórmula mágica: as três vitórias resultaram de situações anómalas ou então verdadeiramente particulares: frente ao Sporting nos descontos; diante do FC Porto jogo condicionado após expulsão precoce de Fábio Cardoso; e, perante o Braga, a tal vida e obra de Zalazar que, no espaço de três minutos, colocou o mundo da Pedreira todo de pernas para o ar.

No capítulo emocional, as vitórias diante de Salzburgo e Braga dão a Schmidt espaço para respirar e recuperar os seus índices de tranquilidade, sobretudo do ponto de vista da comunicação. É certo que quem ganha também fala melhor e, desta vez, nada a dizer ao discurso de Schmidt na conferência de imprensa: sem polémicas, tudo bem explicadinho, sem tiros nos pés e respondendo de forma direta às questões. Sinais de que, pelo menos, a reflexão existiu.

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