O futebol é arte. Não é uma ciência exata, mas vive de resultados. O ideal é que as equipas consigam conciliar o espetáculo ao produto final. E há uma equipa na Liga Sagres que obedece a estes critérios. O Marítimo, por motivos óbvios, disse adeus à política fácil do esbanjamento de dinheiro em jogadores de qualidade duvidosa e tratou de selecionar com maior rigor os jogadores que formam o atual plantel. A decisão peca por tardia, mas veio provar que nem sempre mais recursos são sinónimo de sucesso.
Quando Carlos Carvalhal saiu do comando técnico da equipa, no início da época transata, pensei que o escolhido fosse um brasileiro da Série B ou alguém com um palmarés capaz de fazer um bom trabalho no imediato. Digo isto porque a direção do Marítimo nunca antes tinha pensado em criar um projeto a longo-prazo para a equipa de futebol.
A primeira época não teve sabor. A equipa cresceu gradualmente, os jogadores foram-se conhecendo. No final garantiram um lugar a meio da tabela, sem sobressaltos nem preocupações. Muitos técnicos saíram por menos no passado recente. Mas a administração, pela primeira vez no seu mandato, confiou que era possível conseguir algo de relevo com matéria-prima da casa. O presidente Carlos Pereira resolveu dar utilidade à equipa B e concedeu nova oportunidade a Pedro Martins. Foi aqui que começou a ser ganha esta temporada.
Ruben Ferreira, Sami, Heldon. Além de serem hoje peças basilares do conjunto madeirense, partilham em comum o facto de virem dos quadros secundários do plantel. Juntaram-se a Peçanha, Roberge, Rafael Miranda, João Guilherme e Babá, que se mantiveram da última época e formaram um conjunto sólido e entrosado. O bom futebol que o Marítimo apresenta não é, pois, fruto do acaso e resulta da preparação que os jogadores menos rodados tiveram antes de serem lançados às feras.
Falta ainda falar de Kléber. O brasileiro marcou golos decisivos no apuramento maritimista para as competições europeias, em 2009/2010, mas a meu ver quis dar o salto cedo demais. Porventura pressionado, mas um bom profissional deve saber gerir a sua carreira. Com ou sem ele, o percurso da equipa seria o mesmo este ano. Pouco fez na última temporada para justificar o alarido que a sua saída provocou e o que ele conseguiu, há dois anos, outros já o tinham feito sem o mesmo reconhecimento.
O Marítimo não é, apesar da boa temporada, capaz de discutir algo mais do que o apuramento para a Liga Europa. As derrotas nos jogos com Benfica e Braga, em ambas as voltas, e com o FC Porto, demonstram que, entre outras coisas, falta poder de choque a este grupo. Capazes de trocar a bola como ninguém, não são capazes de perceber taticamente o jogo e, muitas vezes, são incapazes de controlar os ritmos e os momentos do jogo. Os jogadores correm sempre da mesma forma, seja qual for o resultado e não sabem jogar consoante o adversário e as circunstâncias da partida. Mais do que uma forma de jogar, há uma filosofia que se arrasta aos adeptos, sempre insaciáveis e que não aceitam ver a sua equipa ganhar sem jogar bem.
Mas este ano, nem direção nem massa adepta têm razões de queixa. A equipa cumpriu o que se lhe pedia. Com um dos orçamentos mais baixos do campeonato, já quase garantiu a meta da Europa e a próxima época já está a ser preparada, da mesma forma que a atual, com a integração gradual de alguns jovens, como Edivânio e Fidélis, que irão seguramente dar que falar brevemente.